Consciência
conhecimento não é aquilo que aprendemos ... mas sim no que nos tornamos

POPULATION AND METROPOLIZATION

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Gaia e SDi

Gaia e SDi

Urbano Tavares Rodrigues - As eleições de Outubro de 1969

a escolha de 2008 para o 25 de Abril - Testemunhos das eleições de Outubro de 1969

a escolha de 2007 para o 25 de Abril



Saudade de um tempo

que foi de luta e fraternidade


Urbano Tavares Rodrigues

Candidato pelo distrito de Beja


A Campanha Democrática de 1969 marcou profunda e decisivamente a minha vida, levando-me a opções ainda mais radicais e acrescentando, se possível, o meu amor ao povo alentejano. Foi no Alentejo que cresci e aprendi a viver, no paraíso e no inferno. O paraíso era um pequeno "monte" encantado, quase na margem do rio Ardila, a cerca de cinco quilómetros de Moura, berço da minha família. Aí tive o privilégio de conhecer de perto árvores e as fontes, as estrelas e o vento, as aves e os outros animais, em liberdade no campo. Comecei a dialogar com os abegões e os pastores e com as próprias oliveiras e azinheiras dos montados. O inferno foi a descoberta, que não tardou muito, da miséria, do desemprego e da fome. Da humilhação dos pobres. Mas também ali descobri a farternidade alentejana, o sentido da entreajuda e do ardor da revolta.

Fiquei para sempre ligado a essas experiências da infância e da adolescência.

A campanha eleitoral ou pseudo-eleitoral de 1969, na verdade camapanha de agitação e da consciencialização cívica e democrática, falhou numéricamente, emvotos (sabíamos de antemão que assim seria: não havia controle dos cadernos nem a seriedade mínima no acto eleitoral), mas resultou como sementeira de ideias, abrindo caminho ao triunfo do Abril de 74.

Conservo desses dias intensos de luta e de convívio caloroso com as populações memórias de violência: o espancamento de fui alvo em Lisboa, na praça de Entrecampos, tendo eu respondido a soco à agressão dos pides e legionários até cair exausto; como conservo, acesa no meu peito a saudade das reuniões, das sessões em que falávamos ao povo, da multidão que por vezes nos seguia, num despertar de esperança, num acordar de cidadania.

Lembro sempre os outros candidatos, de quem fiquei para sempre amigo, o Celso Pinto de Almeida, o Aníbal Coelho da Costa, o Areosa Feio, e também o Dr. Melo Garrido, o Rocha, o Zé Moedas, o Dr. Sousa Borges, tantos mais. E os meus companheiros de Moura: o Miguel Serrano, o Jaquelino e o Helbert Telo, o Prazeres, o Camacho, o Fialho, o Pós de Mina e muitos mais.

Aquela noite em Moura em que vi na sala apinhada de gente onde falámos os rostos que rodearam a minha infância, aqueles por quem eu lutava então, ainda luto e lutarei, nunca mais poderei esquecê-la. Era como um pacto de afecto e lealdade, de dedicação à sua causa para todo o sempre.

Em Ferreira do Alentejo estive descansando dois dias em casa do aníbal Costa, devido a um problema de saúde ocasionado por lesões que sofrera em Lisboa.

E logo após prosegui a campanha, ao lado dos outros candidatos, atá à grande sessão final em Beja, onde nos dirigimos a uma muitidão vibrante, que connosco vaiou a guerra colonial, a opressão materializada na censuras, nas prisões e na tortura, nos estertores de um fascismo que já se envergonhava de o ser, mas teimosamente se agrrava ao poder.

Havia no teatro futuros oficiais de Abril e uma juventude atenta às nossas palavras, a iniciar-se na luta pela liberdade.

Não batalhámos e sofremos em vão.

Só lamento, hoje, que o alentejo do nosso amor e da nossa esperança, direi mesmo do nosso eufórico sacrifício esteja hoje como está, votado ao desmprego e á desertificação, por vezes à miséria e fome, sobretudo na margem esquerda do Guadiana, sem dúvida devido às secas, aos maus anos agricolas, mas em garnde parte também por via de vonganças políticas e de imperdiáveis esquecimentos.

Lembrando comovidamente a nossa campanha democrática de 1969, aqui deixo também o meu voto de que o Alentejo progrida económicamente, como merece, e em todos os domínios avance, sem se desnaturar, na fidelidade à grandeza dos seus horizontes e à altiva generosidade da sua gente. Desse povo pobre tão rico de humanidade.

Extraído da edição "As Eleições de Outubro de 1969 - Tesetemunhos" da Câmara Municipal de Ferreira do Alentejo - 1999



SM, paslavra fractal